Resumo:
A agregação de indivíduos durante o período de descanso é conhecida como communal roosting. Essa estratégia é comumente observada em aves, podendo ser vantajosa para a otimização de recursos e sobrevivência através da termorregulação, diminuição do risco de predação e informação social. Aves aquáticas são ecologicamente dependentes de áreas úmidas e utilizam esses ambientes para alimentação e descanso. As aves são importantes vetores capazes de ingerir, acumular, transportar e depositar esses contaminantes no ambiente através de fezes, regurgitos, penas, carcaças e cascas de ovos, em áreas também utilizadas para reprodução. Nesse contexto, o presente trabalho teve por objetivo mapear e caracterizar o uso de áreas como dormitórios por aves aquáticas na margem do complexo lagunar-estuarino Tramandaí-Armazém, no litoral do Rio Grande do Sul. O fluxo de chegada e saída das aves foi registrado no mês de setembro de 2021 em três diferentes áreas: no município de Imbé, o Centro de Estudos Costeiros, Limnológicos e Marinhos (Ceclimar), órgão pertencente à Universidade Federal do Rio Grande do Sul, localizado às margens da Laguna de Tramandaí (referido como Ceclimar); no município de Tramandaí, um dormitório à beira de um banhado (referido como Tramandaí), e o outro localizado no bairro Recanto da Lagoa, às margens da Lagoa do Armazém (referido como Recanto). Para Ceclimar e Tramandaí foram registradas as direções de voo, as espécies ocorrentes, e a quantidade de indivíduos a cada 10 minutos, sendo 50 minutos antes do nascer e do pôr do sol, e 30 minutos após os dois horários. Para Recanto, apenas foram contabilizadas as aves que utilizam a área como dormitório. Ao total, foram realizadas oito visitas ao Ceclimar, dez visitas em Tramandaí e 2 visitas ao Recanto, nas quais foram registradas a presença de nove espécies, três famílias e duas Ordens de aves aquáticas. No Ceclimar, foi registrada uma média de 103±57 indivíduos, com número máximo de 214 indivíduos; em Tramandaí, média de 642±221 indivíduos, e número máximo de 1092; e no Recanto, média de 1351±467 e número máximo de 1681. Egretta thula, Ardea alba, Nannopterum brasilianum, Bubulcus ibis e Nycticorax nycticorax foram as espécies mais comuns. A direção de chegada e saída das aves dos dormitórios foi predominantemente o norte, região onde ocorre a presença de ambientes utilizados pelas aves para alimentação, como lagoas, campos úmidos, banhados, campos com pecuária extensiva, e lavouras de arroz. Esses ambientes vêm sendo impactados pela expansão urbana e pelos contaminantes utilizados em áreas de cultivos e pecuária. Embora com uma amostragem temporalmente pontual, este trabalho nos permitiu caracterizar a área de uso de aves aquáticas de forma acurada. A existência dessas áreas de agregações deve ser considerada nos planos diretores das cidades, a fim de subsidiar processos de licenciamento ambiental e auxiliando na tomada de decisões de empreendimentos que envolvem potencial impacto às aves aquáticas, bem como potencial atuação das aves como biovetores e dispersoras de contaminantes, patógenos e nutrientes.